sexta-feira, agosto 26, 2005

Ilusões

"Havia uma aldeia de criaturas no fundo do leito de um grande rio cristalino.A corrente do rio passava silenciosamente por cima de todos eles, jovens e velhos, ricos e pobres, bons e maus, a corrente seguindo seu caminho, só conhecendo seu próprio ser cristalino.

Cada criatura a seu modo se agarrava fortemente às pedras e plantas, pois agarrar-se era seu modo de vida, e resistir à corrente era o que cada um tinha aprendido desde que nascera.
Mas uma criatura disse por fim:
Estou farto de me agarrar! Embora eu não possa ver com meus próprios olhos, espero que a corrente saiba para onde está indo. Vou soltar-me e deixar que ela me leve. Se me agarrar, morrerei de tédio.
As outras criaturas riram-se dele e disseram:
Louco! Se voce se soltar, essa corrente que voce adora o lançará sobre as pedras e sua morte será mais rápida do que a causada pelo tédio.
Mas ele não lhes deu ouvido e, respirando fundo, soltou-se, e foi lançado e despedaçado pela corrente sobre as pedras.

Mas com o tempo, como se recusasse a tornar a agarrar-se, a corrente o levantou, livrando-o do fundo, e ele não se machucou nem se magoou mais.

E as criaturas mais abaixo no rio, para quem ele era um estranho, exclamaram:
Vejam, um milagre! Uma criatura como nós e no entanto voa! Vejam, é o Messias que chegou para nos salvar!
E aquele que foi carregado pela corrente disse:
Não sou mais Messias do que voces. O rio tem prazer em nos erguer à liberdade, se ousarmos nos soltar. O nosso verdadeiro trabalho é essa viagem, essa aventura!

No entanto, cada vez exclamavam mais! Salvador!; enquanto se agarravam às pedras; quando tornaram a olhar, ele se fora, e eles ficaram sozinhos, inventando lendas sobre um salvador."
Richard Bach